terça-feira, 26 de agosto de 2008

Presidente Cavaco

O Sr. Cavaco enquanto estava na presidência do executivo, suscitava amores ou ódios. Agora que entrou na pré-reforma política, quer os amores, quer os ódios se desvanecem. Passam para um estado de passividade crónica, onde nada o que possa dizer nos aquece ou arrefece. Realmente, nunca o que disse o sr. Cavaco era merecedor de grande exaltação, ou emoção mais extrema, ou mesmo um humor mais subtil (agora que penso nisso, nunca ouvi daquele homem uma piada, ou uma tentativa de piada). Mas se a falta de emoção até lhe podemos perdoar, nem que seja só de lembrar do seu “amigo e colega” Santana Lopes, já a ausência de visão futura, de coragem política e de um pensamento mais profundo sobre o mundo de hoje são dignas de reprovação.

O Primeiro-ministro Cavaco gozou dos melhores anos de governação para modernizar o país e de introduzir reformas em todas as componentes do estado, podia até transformar toda administração para uma direcção mais neo-liberal de acordo com a sua origem politica. Mas não o fez. Sim, construiu-se estradas a torto e a direito, literalmente, introduziu-se os subsídios sem nexo na agricultura, que serviram para comprar carros e casas e onde nunca se fez um estudo sobre os resultados dessa politica, nem dessa nem de quase de nenhuma. (Aliás, tantos estudos se fazem e um que gostaria de ver era sobre os resultados dos subsídios de Bruxelas em Portugal, mas adiante).

Cavaco poderia realmente ter ficado na história, como o verdadeiro impulsionador de Portugal, como o estadista que montou um sistema novo e moderno, rápido e ágil. Apesar de não o ter conseguido, nem tentado (seja por ele, seja pelos seus galuchos), foi aplaudido e mais, foi recompensado, tendo embora perdido uma vez. É agora Presidente da República. Confesso, que faz menos mal agora, do que enquanto Primeiro-ministro, mas não deixa de ser incomodativo ter alguém na presidência de República com um discurso tão vazio e seco. Mas Cavaco é assim. Eu sempre soube que dava um bom Presidente. Cavaco, se me permite a comparação futebolística, foi o treinador da manutenção, com ele sabíamos que não iríamos descer, mas que também não sairíamos dos lugares de “ameaça”.

Para finalizar, convido-os a ler o texto de Clara Ferreira Alves, sobre o nosso Presidente. É um texto agudo, onde por vezes a acidez foi excessiva, mas que ajuda a apimentar a história.

http://clix.expresso.pt/gen.pl?p=stories&op=view&fokey=ex.stories/386458
Alves, C. F., A irrelevância cavaquista, in expresso, 2008
(acedido em 26/Ago/2008)

sábado, 23 de agosto de 2008

Política e Cidadania

Na antiga Grécia havia um espaço privilegiado de discussão politica, comercial e cultural. Designava-se como Ágora e eram como assembleias de cidadãos. O facto que a mim mais me fascina neste espaço, era o facto de os cidadãos que aí discutiam os assuntos da cidade, eram iguais entre si e não estavam submetidos nem a nenhum rei nem a nenhum deus. Era o espaço do Homem, perante a sua própria existência. Livre e abandonado, entregue à sua fatídica racionalidade. Um espaço de sagrada humanidade, que me perdoem esta antítese tão difícil de digerir, mas também tão irresistível.

Se o Homem desde muito cedo sentiu a necessidade de organizar-se para garantir a sua sobrevivência, foi na antiga Grécia onde o conceito de “Política” se começa a moldar pelos seus contornos mais “modernos”. Grécia, inventora da Ágora, ao criar a Política e as bases da Democracia, cria também outro conceito, que na minha opinião ainda mais vasto, o de Cidadania.

Se a Política tem como fim último a gestão da coisa comum, já a cidadania é um estado de consciência que todo o Homem deve desejar. Quando escolhemos um determinado modelo de sociedade, para nós, estamos inevitavelmente a eleger o melhor modelo de sociedade para todos nós e deste modo a exercer a nossa qualidade de cidadão enquanto agente de transformação. Assim, ser cidadão é um estado permanente de consciência da realidade e a nossa cidadania manifesta-se em qualquer acto que contenha um projecto de construção da sociedade que cremos mais feliz. A Política surge provavelmente como o braço mais efectivo da Cidadania.

Pretendo, deste modo, utilizar este espaço para exercer a minha cidadania e proporcionar-vos a minha utopia.


Ágora de Tessalônica (fonte: wikipédia)

Actualmente o espaço equivalente à Ágora dos gregos clássicos, seria a nossa Assembleia da República, teoricamente falando. Pois sinto-me bastante incomodado quando passados tantos anos, a evolução foi tão nefasta…




segunda-feira, 11 de agosto de 2008

Todas as guerras são estúpidas

Fotografia de Dmitry Kostyukov/Agence France-Presse - Getty Images

...mas umas conseguem parecer especialmente mais estúpidas.

É verdade que eu tenho visto o meu acesso à informação particularmente limitado, pelo que posso estar a entender mal tudo isto. Por isso, alguém me esclareça por favor se:

_A Geórgia atacou uma província separatista que goza do apoio da Rússia, e onde esta tem tropas de "manutenção da paz" estacionadas;

_A Rússia, como seria de esperar, ripostou com todo o poderio militar disponível, e não só expulsou as tropas da Geógia da Ossetia do Sul, como ainda lhes entrou pelo país dentro;

_A Geórgia assustou-se com a reacção, declarou um cessar fogo unilateral (que parece não estar a cumprir) e apelou ao apoio internacional;

_A Rússia, com o argumento de que está a combater um "genocídio", não pára os ataques e continua a avançar pela Geórgia;

_O presidente da Geórgia põe em causa a existência do país com a continuação dos ataques;

_A Geórgia é atravessada de uma ponta a outra por um oleoduto estratégico que abastece a Europa de petróleo; e a Rússia mal pode esperar por voltar a controlar a Geórgia, e o dito oleoduto.

A verificar-se isto tudo, é impressão minha ou este senhor, Mikheil Saakashvili, acordou uma manhã e decidiu oferecer à Rússia, de mão beijada, o país que governa?

sexta-feira, 8 de agosto de 2008

Realolympic


Às 8 horas e 8 minutos do dia 8 do oitavo mês do ano de 2008, ocorreu a cerimónia de abertura dos XXIX Jogos Olímpicos. Independentemente da grandiosidade ou não da cerimónia, do maior ou menor número de medalhados, de ocorrerem ou não atentados terroristas, estes Jogos Olímpicos ficarão para a história como o momento em que o mundo se deixou prostituir a troco de um punhado de dólares.
A poucos meses da cerimónia de abertura, durante o percurso da chama olímpica, teve-se a primeira demonstração pública e mediática do que é o sistema político da China. Por essa altura, uma violenta repressão ocorreu no Tibete, não antes de todos os repórteres e estrangeiros terem sido expulsos do país ocupado. De repente, descobriu-se que a China bloqueia o acesso a determinados sítios da internet restringindo a liberdade de expressão. De repente, a comunicação social lembrou-se que a República Popular da China é uma ditadura; que não respeita os direitos humanos; que invadiu e permanece ocupante do Tibete; que vende armas aos mais criminosos regimes deste mundo; que usa a sua posição como membro permanente do conselho de segurança da ONU para proteger governos hediondos; etc.
Mas a China é muito mais do que isto. A china é o terceiro maior país do mundo, o mais populoso, uma superpotência militar e política e a quarta maior economia do planeta. Por tudo isto, e muito mais, recorre-se à Realpolitik e ignora-se tudo o resto. Assim o fez José Sócrates ao apertar a mão a Kadafi, ao elogiar o “trabalho notável” do governo de Angola, ou ao trocar umas palmadinhas nas costas com Hugo Chávez. Perante a possibilidade de um negócio chorudo interessará tudo o resto? O Comité Olímpico Internacional e as grandes potências mundiais, acham que não. Vejam-se os líderes mundiais presentes na cerimónia de abertura.
O nível de cegueira auto-induzida é tanta que, há cerca de uma Semana, o COI emitiu um comunicado em que pedia desculpa à comunicação social estrangeira em Perquim. Por haver censura na China? Não! Pediam desculpa porque poderiam ter induzido em erro, ao longo destes meses, aqueles que acreditavam que a China seria mais tolerante durante o período dos JO.
Fascina-me o argumento de que os Jogos Olímpicos são um evento desportivo e não se deverão imiscuir com a política. Mas há algum assunto da nossa vida em que a política não tenha nada a ver? E os Jogos Olímpicos de Berlim, Melbourne, Munique, Moscovo, Los Angeles, ou a resolução 1761 da Assembleia-Geral da ONU? Não foram tudo motivos políticos?
Não defendo um boicote aos JO de Pequim. Tal como não defendo um corte de relações diplomáticas com a China, nem um bloqueio à importação de produtos chineses. Defendo sim, que não se esqueça o que a China é, e o que pode vir a ser. Defendo que não se troquem direitos humanos por dinheiro, nem que se seja hipócrita por uns dias, só porque convém. Sejamos sérios.
A China é demasiado importante para se ofender, mas demasiado suja para se beijar. Assim, estende-se a mão e finge-se não olhar para a sujidade. Cumprimenta-se e saúda-se o anfitrião mas sem se curvar muito. Ignora-se tudo o resto se houver a possibilidade de um bom negócio. Se pensarmos bem, é mais ou menos assim que funciona a prostituição.
Não nos calaremos ….

Na primeira noite, eles aproximam-se
e colhem uma flor de nosso jardim.
E não dizemos nada…


Na segunda noite, já não se escondem,
pisam as flores, matam o nosso cão.
E não dizemos nada…

Até que um dia, o mais frágil deles,
entra sozinho em nossa casa, rouba-nos a lua,
e, conhecendo o nosso medo,
arranca-nos a voz da garganta.
E porque não dissemos nada, já não podemos dizer nada.

Maiakovski (1893-1930)

"Gostava que este grito se amplificasse…Não gostaria de ser acusado de não ter dito nada… e já ser tarde de mais."

Apresentação

Um blogue para discutir política e assuntos relacionados, escrito por pessoas de diferentes ideologias políticas, localizadas em diferentes pontos da Europa. O objectivo geral é opinar, debater e informar, despretensiosamente. Cada texto é da exclusiva responsabilidade do seu autor. Os comentários são livres, mas poderão ser eliminados caso sejam considerados ofensivos.